Começo a
escrever e o que me veio à ideia logo, de imediato, foi algo que julgava
esquecido , porque se calhar não tinha tido precisão de me lembrar.
Dos primeiros
marcos do correio, se não mesmo o
primeiro, que me lembro de ter contacto, quiçá iniciático, e que foi com o marco
do correio que existia ali mais ou menos ao fundo da minha rua, já na Estrada
da Circunvalação (EN12), junto ao final da Rua de Azevedo, onde havia uma das
casas de fiscalização (para cobrança de impostos municipais, no caso a de Campanhã
).
O meu pai, um
viajante de profissão, recolhia em gordos inchados e ao mesmo tempo diminutos
envelopes as notas de encomenda que enviava à Vieira Araújo Lda., em S. João da
Madeira (fábrica dos lápis VIARCO, dos chapéus Águia, etc.). Era pequeno mas
tenho ideia de fazer com muito entusiasmo a viagem ao fundo da rua, eu e o meu
irmão, no carro do meu pai, sem cinto e muitas vezes sentados ou de pé à
frente, sem sairmos do carro, um de nós se esticava o mais que podia, e fazendo
dos bracitos pequenos grandes, metiamos o envelope no marco do correio. Uma
distância curta, ir e voltar eram uns 500 metros (?), e se fosse ao domingo de
manhã, enquanto a minha mãe preparava o almoço, depois iamos até um jardim à
beira rio (se tivessemos sorte até ao jardim no Fluvial, brincar com os canhões
que ainda por lá andam...).
Este marco
já não existe, toda a zona foi reconfigurada, a Estrada da Circunvalação hoje
tem outro formato e trajecto nesta zona, fica um pouco mais para baixo e, não
tenho desde então grande ideia de histórias que pudesse contar de outros marcos
de correio, e de outras correspondências do meu pai ou até minhas. Na idade
destas coisas, a adolescência, senti de facto algum entusiasmo, ou interesse,
em me corresponder se bem que, não tendo grandes possibilidades de o fazer,
face sobretudo à inexistência de uma mesada que me permitisse mais que o
dinheiro do transporte ou para uma sandes ou um croissant no bar da escola, ou
uma “brouínha” na Douro (confeitaria na Corujeira, frente ao matadouro), via os
meus colegas de liceu colecionarem “pen pals” de diferentes paragens,
conhecendo dessa forma outras realidades, e praticando as línguas que
aprendiamos, mais do que nas aulas, inglês e o francês, sobretudo. Uma espécie
de rede social, não da idade da pedra, mas do papel e da caneta e dos selos do correio. Só muito mais
tarde fiz algo no género, por diversas outras razões, conheci pessoas, locais,
correspondendo-me por carta. Sendo para
mim curioso de corresponder com uma espécie de “pen pal” de modelismo, o Sergej
Klimov, de Krasnodar (na actual Geórgia), e ainda, no seguimento de um trabalho
que fiz sobre aviação, refira-se também um curioso envelope que recebi do Paquistão
... [http://www.passarodeferro.com/2015/01/o-alouette-iii-no-paquistao-m1777.html].
Ainda hoje mantenho
algumas tradições escrevinhatórias, muito poucas, uma delas em especial, a de
enviar umas mãos cheias de postais de Boas Festas. Parece-me uma boa tradição
para a qual preciso, ainda de um marco do correio, não que faça questão.
Numa postagem
muito curiosa que encontrei nas redes sociais, em que falava exactamente disso,
das redes sociais, opondo, de certa
forma as redes sociais de hoje às do antigamente, das cartas escritas com letra
certinha, altura em que “seguiamos” alguém por carta e com tanto afinco que
quase não respiravamos entre cartas, e ia-mos dormir para a porta de casa para
estarmos mais perto da caixa do correio na ânsia de mais uma missiva, dois
interfaces físicos deste “messenger”,
marco do correio (INPUT) e caixa do correio lá de casa (OUTPUT), a comunicação
demorava alguns dias, mas bem vistas as coisas até era pouco, curtinho até, mas
que a ânsia que vai da distância entre a carta que enviamos à resposta recebida
fazia alongar.
Hoje em dia
seriamos todos considerados retrogrados se ainda escrevessemos à mão cartas para
enviarmos às pessoas que nos “seguem”, remetendo-as pelo correio, num envelope com
um selo colado com saliva...
Adiante. Estações
e marcos do correio foram sendo obliterados da nossa cidade pelo camartelo do costume,
o progresso, o camartelo da automatização, da despersonalização das tarefas de
correspondência, mas sobretudo, desde o advento da internet, e dos telemóveis
sofisticados que servem para tudo menos falar ao telemóvel, a comunicação
deixou de ser postal, passando a instantânea, as pessoas escrevem cada vez
menos cartas ... confesso que parte é culpa minha, eu próprio deixei de
escrever ... Por volta da altura em que escrevia estas linhas, ia eu a passar
frente ao Matadouro, lembrei-me do marco que havia ali quase em frente, na
esquina do passeio onde ficava o consultório do Dr. Maurício (Dr. Maurício
Esteves Pereira Pinto), que ficava por cima da farmácia. Acho que usei este
marco algumas vezes, mas como tantos outros, foi retirado.
A presente
postagem tem que ver, não com a correspondência, mas antes com a partilha de
fotos de alguns dos marcos do correio que podemos (à data) ainda encontrar na
cidade do Porto.
Pelo que julgo
saber, e sem grandes pesquisas, os marcos do correio metálicos na via pública
foram introduzidos em Portugal em 1811, imagino eu que no Porto também por
volta dessa altura. A origem dos primeiros marcos copia o modelo inglês, e não
só os copia como os primeiros eram mesmo ingleses, adquiridos ao Royal Mail
(acho), em alguns dos quais ainda encontramos nos dias de hoje. Mais tarde
foram implementados marcos maiores, cilindricos, existindo bastantes de
diferentes modelos e origens, tanto nacionais como estrangeiros.
Pela literatura que consultei, os wallboxes são posteriores aos pillarboxes, e não o contrário, pelo que admito que em Portugal tenham sido introduzidos na mesma sequência.
Marcos de correio em paredes (wallboxes)
Os marcos em
paredes talvez sejam dos primeiros,
desde logo por os seus números serem os mais baixos, muitos destes apresentam
ainda hoje, a coroa britânica por cima da abertura, a denotar a sua origem
inglesa. Alguns destes foi retirada parte deste símbolo, mas ainda se consegue
ver na maioria.
É possível
que, ao longo do tempo, alguns destes marcos, possam ter sido modificados, ou
substituídos, e retirados também, mas não pretendo que este trabalho seja
demasiado exaustivo.
1 – Rua João
de Oliveira Ramos ( frente ao nº104 / ao lado da BIAL)
Fabricante: W.T. Allen & Co. Ltd.,
London
Este fabricante só começou a fabricar wallboxes para os correios ingleses a partir de 1881, no reinado da Raínha Victoria, pelo que se supõe que esta seja contemporânea.
2 A – esquina
da Rua Padre António Vieira com a Rua do Freixo.
24A –Rua Antero de Quental, entre os nos.37 e 39.
Apresenta
uns dizeres gravados na pala por cima da abertura, mas não consegui perceber a
origem.
39A - Rua S. Vitor
Apresenta uns dizeres gravados na pala por cima da abertura, possivelmente o nome do fabricante, mas não consegui perceber.
Apresenta uns dizeres gravados na pala por cima da abertura, possivelmente o nome do fabricante, mas não consegui perceber.
43A – Rua Álvaro Castelões (quase a chegar a Costa Cabral).
126 – Rua
das Flores, entre os números 82 e 84.
Apresenta
vestígios da coroa inglesa acima da abertura.
127 – Rua do
Moreira (nº161)
Apresenta
vestígios da coroa inglesa acima da abertura.
273 -
Apresenta
vestígios da coroa inglesa acima da abertura.
274 – Rua
Trindade Coelho nº 37.
Apresenta
vestígios da coroa inglesa acima da abertura.
275 - Na Rua
de Miguel Bombarda (junto à Rua de Cedofeita). É um dos que mais gosto porque
foi com este que comecei a formular a ideia deste tema, já que me chamou à
atenção a coroa em cima da abertura. Este é o que
apresenta ainda a coroa britânica mais completa e, por semelhança, poderá ser um modelo de wallbox do periodo do rei Eduardo VII (> 1901).
280 - no cruzamento da Rua de Costa Cabral com a Rua Dr. Júlio de Matos.
Muito apagado mas, com a incidência de luz correcta ainda se percebe onde estava a coroa britânica acima da pala.
297 - Ao fundo da Rua de Horácio Lima.
309 - No
Largo da Fontinha (entre o nº8 e 9)
Apresenta
vestígios da coroa inglesa acima da abertura.
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Marcos de correio do modelo pilar (pillar boxes)
Agradecimentos: Lexi (pela localização do 297 e 280)
Bibliografia
Old Letter Boxes, by Martin Robinson, f.p. 1987